o futuro, em si mesmo, a aborrecia...

- Disse que nós dois somos iguais - falei - em que sentido?

Sim, sim, exclamou, no sentido em que eu também, como ela, não dispunha daquele prazer instintivo pelas coisas que caracteriza as pessoas normais. Ela intuía isso muito bem: para mim, e não menos para ela, mais do que o presente, o passado é que tinha importância, mais do que a posse, as recordações. Frente à memória, qualquer posse só pode parecer decepcionante, banal, insuficiente...Como me compreendia! O meu desejo de que o presente se tornasse "logo" passado, para que eu pudesse amá-lo e extasiar-me com ele, era também seu, tal e qual. Este era o "nosso" vício: seguir em frente com as cabeças sempre voltadas para trás. . Não era assim?

Era assim - não poderia deixar de reconhecer comigo mesmo - era exatamente assim. Quando é que a havia abraçado? No máximo uma hora antes, não mais que isso. E tudo já se tornara irreal e fabuloso como sempre: um acontecimento para não ser acreditado, ou para se temer.

Giorgio Bassani. O jardim dos Finzi-Contini. Record. 1996. p.167.

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